São Jerônimo e o leão

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Compartilhamos com o estimado leitor, uma crônica extraída da vida do grande Doutor da Igreja, São Jerônimo, cuja festa celebraremos no próximo dia 30 de setembro:

“Certa vez, ao cair do dia, quando Jerônimo estava sentado com seus irmãos para escutar a leitura sagrada, de repente entrou no mosteiro um leão que mancava. Vendo-o, todos os irmãos fugiram, mas Jerônimo foi ao seu encontro como se ele fosse um hóspede. O leão mostrou que estava ferido na pata e Jerônimo chamou os irmãos, ordenando-lhes que lavassem a pata dele e procurassem atentamente o lugar da ferida. Assim fazendo, descobriram que espinhos haviam machucado a planta da pata. Todo cuidado foi dedicado ao leão, que, curado, passou a morar com eles quase como um animal doméstico. Então Jerônimo percebeu que não era tanto para curar a pata do leão, quanto pela utilidade que disso se poderia tirar, que o Senhor o enviara. A conselho dos irmãos, decidiu confiar-lhe a tarefa de conduzir ao pasto e proteger o asno que a comunidade empregava para trazer lenha da floresta. Assim foi feito. O leão cuidava do asno como um hábil pastor, servia de companheiro que todos os dias ia aos campos com ele e era seu vigilante defensor enquanto ele pastava. Só o deixava um pouco para procurar seu próprio alimento, e todos os dias na mesma hora voltava com ele para casa.

Um dia, porém, o asno estava pastando e o leão adormeceu profundamente, quando passaram por ali mercadores com camelos, que viram o asno sozinho e o raptaram. Ao acordar, não achando seu companheiro, o leão pôs-se a correr aqui e ali, rugindo. Enfim, não o encontrando, voltou muito triste para as portas do mosteiro, e cheio de vergonha não teve coragem de entrar como fazia habitualmente. Os irmãos, vendo-o voltar mais tarde que de costume e sem o asno, acharam que, levado pela fome, ele comera o animal e não quiseram lhe dar sua ração costumeira, dizendo-lhe: “Vá comer o que sobrou do burrico, vá saciar sua gula”. Entretanto, como não estavam certos de que ele tivesse cometido essa má ação, foram ao pasto ver se encontravam um indício de que o asno estava morto. Não encontraram nada e foram relatar tudo a Jerônimo, que impôs ao leão a função do asno: trazer nas costas a lenha cortada. O leão suportou isso com paciência.

Um dia, depois de cumprida sua tarefa, foi ao campo e pôs-se a correr aqui e ali desejando saber o que fora feito de seu companheiro, quando viu ao longe chegar negociantes conduzindo camelos carregados, tendo um asno na frente. O hábito nessa região é que quando se vai a longa distância com camelos, estes, para seguir um caminho mais direto, são precedidos por um asno que os conduz por meio de uma corda presa ao pescoço. O leão reconheceu o asno, lançou-se com terríveis rugidos sobre eles e pôs todos os homens em fuga. Com pavorosos rugidos, batendo a cauda com força no chão, forçou os assustados e carregados camelos a ir na frente dele para o estábulo do mosteiro. Quando os irmãos viram aquilo, informaram Jerônimo, que disse: “Lavem, caríssimos irmãos, as patas de nossos hóspedes, deem-lhes de comer e aguardem sobre este assunto a vontade do Senhor” O leão começou a correr pelo mosteiro, cheio de alegria, como fazia antigamente, prosternando-se aos pés de cada irmão. Parecia, brincando com a cauda, pedir perdão por uma falta que não cometera.

Jerônimo, que sabia o que ia acontecer, disse: “Irmãos, vão preparar o necessário para os hóspedes que vêm aqui”. Ainda falava, quando um mensageiro anunciou que estavam à porta hóspedes que queriam ver o abade. Ele foi encontrá-los, os negociantes lançaram-se imediatamente a seus pés pedindo perdão pela falta. O abade mandou com bondade que se erguessem, retomassem seus bens e não roubassem os dos outros. Eles rogaram que o bem-aventurado Jerônimo aceitasse metade de seu azeite e os abençoasse. Depois de muita insistência, obrigaram-no a aceitar a oferenda. Prometeram ainda dar aos irmãos todo ano uma quantidade igual de azeite e impor a mesma obrigação a seus herdeiros.”

FONTEJacopo de Varazze; Legenda áurea: vidas de santos. - São Paulo: Companhia das Letras, 2003-
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