Autor: Luís Dufaur
É atrativo passar uma noite num antro de sofrimento por onde passeou a morte? E, mais ainda, numa cela soviética na Letônia?
Há turistas que acham que sim.
Chega-se à prisão de Karosta, em Liepaja, oeste da Letônia, sobre o mar Báltico, atravessando uma densa floresta onde foram fuzilados e enterrados não poucos reclusos.
Os funcionários recebem com uniformes militares e gestos adustos. E instruem os hóspedes sobre as normas para sobreviver uma noite, narra uma reportagem de “La Nación” de Buenos Aires.
Construído por volta de 1900 para ser hospital, os comunistas o transformaram em cárcere inexpugnável do qual cativo algum evadiu com vida.
Começou a funcionar sob o czarismo russo, foi requintado pelo bolchevismo, por nazistas e por comunistas soviéticos e funcionou até 1997.
Foi posteriormente reciclado em museu, teatro, e agora em hotel de terror que oferece a experiência de sentir por algumas horas as angústias de um condenado.
Em rigor, não é bem o mesmo, porque o hóspede sabe que sairá em hora marcada, sem ferimentos e levando seus objetos pessoais.
Mas há opções que compensam essas “felicidades burguesas”.
Os carcereiros reproduzem em montagens cenas que teriam aterrorizado os antigos condenados.
Há uma opção de quarto pequeno, mas limpo, com duas estruturas de ferro que sustentam uns esquálidos colchões.
Na segunda opção, a cela é mais escura e só tem uma janelinha através da qual se filtram débeis raios de luz e onde esqueléticos colchões se apoiam diretamente sobre o chão cinza e gélido.
Após o check-in, um guia e um carcereiro conduzem o hóspede pelos andares do cárcere, contando fatos trágicos e cruéis, histórias de fantasmas, de mortos que deambulam pelos corredores e os métodos de castigo de épocas pretéritas.
O interruptor da luz do quarto fica no corredor, a dois metros de altura.
O hóspede-presidiário logo percebe que em seu setor não há mais ninguém.
A porta do quarto é de madeira grossa e pesada, e só fecha por fora.
Uma janelinha permite ao guarda vigiar tudo o que acontece.
O toalete fica na outra extremidade do pavilhão.
Chega-se até ele caminhando num silêncio inquietante através de um longo e lúgubre corredor mal iluminado.
Através das janelinhas das celas pode-se ver o que há nos cubículos vazios.
O pátio do cárcere é a única alternativa de distensão, mas é sombrio e transmite a opressão de espírito que afligia os detentos.
Apagando-se a luz, o silêncio afia os sentidos: qualquer som ou palavra no quarto se amplifica, antes de desaparecer na escuridão.
As histórias tétricas do local, as aberrações ali praticadas, as tragédias que se desprendem das paredes assaltam o pensamento.
Na manhã seguinte o guarda acorda o hóspede e o manda arranjar a cama.
Lá fora um militar ordena um grupo de jovens a re
alizar exercícios militares antes de ingressar na prisão.
O que faz alguém querer passar por esse túnel de horrores?
A doutrina católica diz que vai ao inferno quem quer.
O hotel-prisão de Karosta ajuda a compreender como isso pode acontecer.