Tal é o fundamento de todas estas ideias: a nobreza é chamada a proteger e purificar o mundo por meio do cumprimento do ideal cavalheiresco.
A vida reta e a reta virtude da nobreza são os meios de salvação para os maus tempos: o bem e a paz da Igreja e da Monarquia, o império da justiça, dependem dela.
Duas coisas há – isso se diz na vida de Boucicaut, um dos mais puros representantes do ideal cavalheiresco da última Idade Média – postas no mundo como dois pilares pela vontade de Deus, para sustentar a ordem das leis divinas e humanas; sem elas, o mundo seria só confusão; tais coisas são a cavalaria e a ciência, “chevalerie et science, que moult bien conviennent ensemble”.
“Science, Foy et Chevalerie” são os três lírios do “Chapel des Fleurs de Lys” de Philippe de Vitri. Representam três estados.
A nobreza é chamada a proteger e amparar os outros dois.
A equiparação da nobreza e da ciência, que se revela também na inclinação a reconhecer no titulo de Doutor os mesmos direitos que no titulo de Cavaleiro, atestam o alto valor moral do ideal cavalheiresco.
Há nele a veneração de uma vontade e arrojo superiores, junto à de uma ciência e capacidade superiores.
Sente-se a necessidade de ver os homens elevados a uma potência superior, e trata-se de dar a esta necessidade a expressão de duas formas fixas e equivalentes de consagrar-se a uma tarefa vital superior.
Mas destas duas formas tinha o ideal cavalheiresco uma influência muito mais geral e poderosa, porque nele se uniam com o elemento ético tantos elementos estéticos que tornava-se compreensível para todo o espírito.
(Fonte: Johan Huizinga, “El Otoño de la Edad Media”, Revista de Occidente, Madrid, 1965, 6ª. Edición.)