Há entre o político que ascende aos mais altos graus da admiração, munido de profundos conhecimentos filosóficos, jurídicos e sociais, e o político que leva às eminências do poder, como única bagagem, uma pequena cultura e uma grande ambição, a mesma diferença que existe entre o médico e o curandeiro. O primeiro se orientará pela ciência não menos do que pela prática. O segundo procederá com um empirismo cego, aplicando aos problemas de hoje o mesmo repertório de fórmulas que ele viu “dar certo” ontem.
Pertencia à primeira categoria Thomas Morus: o político não matou nele o filósofo nem o teólogo; mas o filósofo e o teólogo governaram o político, iluminando-lhe o caminho, ditando-lhe os horizontes e dirigindo-lhe a ação. […]
Nos intermináveis interrogatórios, foi-lhe ao encontro a perfídia de Thomas Cromwell [primeiro-ministro de Henrique VIII], que procurava por meio de hábeis perguntas, convencê-lo do crime de alta traição. Morus, porém, não se deixou enredar e, com a tranquila firmeza de uma alma pura, pronunciou esta frase que resume toda a sua defesa: “Sou fiel ao rei, não faço o mal a ninguém, nem difamo a quem quer que seja; se isto não é suficiente para salvar a vida de um homem, não quero viver por mais tempo”.
(*) Excertos do artigo publicado em “O Jornal”, Rio de Janeiro, 22 de junho de 1935.