A mente por de trás de um palhaço

Geralmente conhece-se Rousseau por ser uma das principais mentes por de trás da sanguinária Revolução Francesa – primeiro genocídio moderno ocorreu na região da Vandeia onde mais de um milhão de vidas foram ceifadas. A Revolução Francesa teve com principal caráter a “revolução social”, porém, além disso, lhe renderam ainda aspectos filosóficos, religiosos e sociais. E Rousseau influenciou esse fatídico evento em absolutamente todos os aspectos citados.

            A filosofia conduzida pelo pensamento iluminista (a razão que ilumina o homem e não a religião – leia-se sentimentalismo, segundo eles, claro) levou em conta muito mais o uso do cientificismo do que o uso da lógica religiosa. Isso abriu portas para uma religião material, e não imaterial. Basta ver o próprio protótipo de religião de Rousseau.

            A religião para Rousseau era identificada pelo naturalismo. Segundo ele, o homem não nasce bom e a sociedade o corrompe. Para ele a natureza humana era boa – por esse princípio ele passava por cima do “pecado original” -, ou seja, o homem nascia bom em tudo, e por isso o homem encontrava Deus no próprio coração. Isso o levou a ser contra a revelação divina, isso quer dizer, ele acreditava que Deus não precisava aparecer aos homens, porque ele já estava inserido no ser humano. Devido a isso duvidava das interpretações religiosas existentes.

            Em sociologia o filósofo devotava crédito à ideia de que os privilégios eram desigualdades injustas, ao contrário da desigualdade natural – que é intrínseca ao ser humano -, devido a esses privilégios originados de instituições civis, o homem deveria voltar ao seu princípio – no caso abandonar a civilização, como ele mesmo diz: “Para desfazer o mal, basta abandonar a civilização. Quando alimentado, em paz com a natureza e amigo dos semelhantes, o homem é naturalmente bom”. Dai provém o mito do bom selvagem. Devido a isso a Revolução Francesa adotou como modelo uma visão crítica à nobreza absolutista, que na qual mostrava aversão ao luxo, aos costumes e a alta cultura da sociedade – foi por esse motivo que ao invés de os homens após a revolução continuarem a usar espadas, eles começaram a usar guarda-chuvas no lugar, a mulher por sua vez começou a deixar os vestidos mais curtos, assim sucessivamente.

            A justiça para ele se aplicaria em um estado utópico e ideal – é uma precursão do comunismo -, onde para que não houvesse injustiças os homens tivessem direitos concedidos pelo estado de maneira a proporcionar a todos a igualdade. Dai provém o igualitarismo social. Segundo ele essa sujeição ao Estado tem o efeito de fortalecer a liberdade autêntica, uma vez que ele garantiria a todos direitos iguais tornaria o homem liberto das injustiças e assim teria uma liberdade autêntica.

Verborragias provenientes

            De Rousseau surgiu o movimento posterior ao Iluminismo que foi o Romantismo. Ele é tido como o primeiro a acender o fósforo que colocou fogo na moral já amoral do homem da época. Como já dizia Plínio Corrêa de Oliveira “a história sempre se repete”, o Romantismo em uma visão rousseauniana iniciou o processo da crença de que a natureza era boa, e a ela devíamos depositar total crédito de confiança – isso já se opunha a razão, mas foi assim que se sucedeu -, uma vez que a civilização já estava corrompida com uma visão muito racionalista.

            Foi inclusive dele que surgiu uma das óperas que em certo sentido abriu o romantismo musical e começou a colocar o fim no classicismo: O Adivinho da Vila, onde aborda uma história pastoril e camponesa ao retratar um casal de camponeses. Esse casal era composto por Colin e Colette, sendo Colette traída por seu marido Colin, que foi viver com uma senhora muito rica da cidade. Colette, devido à traição de seu marido, permanece em sua vida feliz e simples no campo, aguardando a resposta dos tempos que ainda viriam, sendo essa resposta dada pelo Adivinho, um sábio que solucionaria o problema dos camponeses em relação aos costumes e as tradições preconceituosas dos absolutistas e tradicionalistas nobres.

            Além de romântico, Rousseau foi em certo sentido a abertura do comunismo mais descarado. Isso se deve ao fato de que sua obra Contrato Social foi um espelho para que no século seguinte Karl Marx fizesse O Capital. Devido à falha da Revolução Francesa, onde fora aplicado, de fato, o pensamento rousseauniano, o marxismo entrou como princípio nas revoluções que se sucederam e se preservam até os dias de hoje.

            Como a religião é o fator mais intrínseco ao homem a revolução não tardou em aplicar na prática o naturalismo de Rousseau. A mando da União Soviética no século passado, foi criada a “teologia da libertação”, uma nova teologia que em teoria libertaria o homem das garras contemplativas da religião, e presaria muito mais pela natureza do homem do que do espírito – ou seja, é um naturalismo religioso, muito semelhante ao ideal de religião de Rousseau. É dai que surge a ideia de exclusão da religião, e o apego à ação social plenamente material como meio de triunfo da revolução.

Iluminismo: a idade das luzes negras

            Dentro da filosofia Iluminista existe um eterno paradoxo entre razão e lógica, porque é claro que a lógica é uma forma de explicar a razão. O problema central no iluminismo é explicar o material como fonte primária do bem ao homem, e isso é o ilógico e irracional.

            É racional justificar a criação do material sem o imaterial? Ou ainda usar o argumento de que o imaterial serve de pretexto para sentimentalismo, logo o mais lógico é utilizar o material como pretexto para criar um “século de luzes”?

De fato, não existe lógica nisso. Além disso, não fora a religião a responsável por criar o sentimentalismo, mas foram os materialistas os responsáveis por tal feito. Basta analisar o movimento posterior ao iluminismo: o romantismo.

            Diziam eles que o homem deveria ser movido pelo uso da razão. Porém, que razão o homem é fundamentado se não pelo seu próprio início? Ora, entende-se razão por motivação, e tudo tem um motivo. E de quem partiu a motivação da matéria se não do imaterial?

Partindo das premissas do Argumento Cosmológico, que são irrefutáveis segundo a lógica, notamos pontos fundamentais que tratam simplesmente da criação do universo. Esse argumento é composto por duas vias que explicam a criação da matéria:

Primeiro: tudo o que vem a existir tem uma causa; não se vê matéria física surgindo simplesmente do acaso. É essa uma regra universal, uma lei fundamental da realidade. Tudo que existe tem uma causa primeira. Partindo disso, logicamente, toda causa precede seu efeito em existência. Nenhuma causa pode ser o seu próprio efeito, toda causa é anterior ao efeito, e diferente do efeito, portanto, é impossível algo existir sem ter tido uma causa primária. A causa primária é imaterial, e não material, e devido a isso não se deve depositar o crédito de “razão” à matéria e a natureza. É racional afirmar isso, logo o iluminismo já se cerca de contradição, uma vez que negava os “dogmas” da religião – que são lógicos e muito racionais.

Segundo: O universo veio a existir; se é dito que o universo se expande, e como toda coisa que se expande e aumenta de tamanho em algum momento do passado essa coisa começou a se expandir.

De acordo com Kant “o iluminismorepresenta a saída dos seres humanos de uma tutelagem que estes mesmos se impuseram a si. Tutelados são aqueles que se encontram incapazes de fazer uso da própria razão independentemente da direção de outrem. É-se culpado da própria tutelagem quando esta resulta não de uma deficiência do entendimento, mas da falta de resolução e coragem para se fazer uso do entendimento independentemente da direção de outrem”

Primeiro, a tutelagem é intrínseca ao homem, e de acordo com as premissas cosmológicas é racional admitir que a razão imposta ao homem já é superior a própria natureza humana.

Segundo: se tutelado é aquele que se encontra incapaz de fazer o uso da própria razão é necessário admitir que todo homem precisa de um superior, uma vez que ele já nasceu de dois superiores; o pai e a mãe. Além do mais, em tudo o homem precisa de ensino por parte de um superior, e sendo assim ele nunca será iluminista, pois ele não nasce sabendo e morre muitas vezes na dúvida.

Ora, por esse ponto de vista é possível concluir que a razão humana é limitada, logo propensa ao erro, e o erro é irracional. Devido a isso devemos admitir que a busca do finito – leia-se matéria – como resposta para todas as coisas do mundo é um ato de irracionalidade, logo devemos buscar o infinito.

Terceiro: fazer o uso do entendimento independentemente da direção de outrem é estar exposto muito mais ao erro do que ao acerto, e o erro é irracional. Como é possível que eu vá acertar sem a instrução da verdade – superior ao homem?

O naturalismo religioso

No mínimo é muito contraditório acreditar que a maldade sai da sociedade e não do próprio homem. Ora, como é possível se afirmar que o homem nasce bom e a sociedade o corrompe, se a própria sociedade é formada pelos homens? A maldade sai de um conjunto de homens? Se sim, ela sai do homem, uma vez que um conjunto de homens não tem girafas, jacarés e nem pássaros, mas homens! E sendo assim conclui-se que essa afirmação propugna o erro – nada racional.

A coisa se torna mais contrária à ideia de um Deus naturalista quando se diz que o homem encontra Deus no próprio coração, que de fato é um acerto, porém como é possível o homem não ser mal, se dentro de um conjunto de homens que encontram Deus no coração, ele se corrompe?  Quem o corrompe não é a própria natureza que é falha?

Segundo Rousseau as revelações divinas não são necessárias aos homens, uma vez que Deus já está inserido no coração deles. A grande questão é que a razão humana é limitada, por isso mesmo não conhecemos Deus em sua infinidade. Por motivos correlatos ele nos deu sentidos; tato, olfato, audição, visão e paladar. A revelação nada mais é que o próprio Deus aparecendo aos olhos dos homens. Ora, sendo Ele dono da matéria e sendo a razão humana limitada, Deus não pode por livre e espontânea vontade aparecer ao homem, que muitas vezes é enganado pela própria razão, graças aos artifícios preternaturais?

A justiça injusta

            Os privilégios quando conquistados de forma legítima não podem ser injustos, isso é, com o esforço do trabalho, seja físico ou intelectual. Foi por esse motivo inclusive que Rousseau conquistou títulos e prêmios acadêmicos e seu cargo no reino – ou seja, primeiro ele usufruiu ao máximo da civilização que ele dizia ser necessário abandonar, teve mais de três amantes, abandonou os cinco filhos que teve, foi sustentado pela nobreza e ai sim foi viver junto da natureza. Só por esse ponto de vista se concluiu que ele mesmo não cumpria o que dizia.

            O mito do bom selvagem surgiu a partir do comentário de Rousseau que denotava que o homem só se tornaria naturalmente bom quando retornasse em paz para a natureza e a seus semelhantes – aqueles que adotassem certo regime tribal. É bem curioso saber que por mais que ele tenha exprimido nesse sentido que os índios são pessoas boas, no fundo no fundo ele quis dizer que a verdade é relativa, porque cada tribo indígena tem uma forma de pensar – leia-se de usar a razão -, sendo essa boa, de qualquer forma, uma vez que o homem em seu princípio é naturalmente bom. Então entrar em guerras de tribos, cometer infanticídios, antropofagia, e outras práticas tirânicas eram positivas. Claro, é a sociedade que corrompe o homem, e por qual motivo então Rousseau propôs um modelo de estado? E sendo essa proposta utópica – como já foi mostrado – é necessário confessar que em um ponto de vista rousseauniano ele era um miserável sonhador, porque além de contradizer os próprios princípios tinha devaneios a respeito de um tribalismo que nem existia, ou melhor, dizendo, um homem em harmonia com a grama, as árvores, as folhas, porém sem sociedade – algo certeiramente incongruente com a natureza humana e inclusive animal. No fundo, era o retrato do homem romântico: o homem das fantasias.

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Técnico de logística pela ETEC Lauro Gomes e membro "de jure" do Instituto Plínio Corrêa de Oliveira

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