O Menino Jesus de Praga

A imagem do Menino Jesus de Praga, a mais famosa do Divino Infante, tornou-se objeto de veneração universal, com réplicas disseminadas em todo o orbe, inclusive no Brasil.

“Pequeno Rei”

O Menino Jesus em seu altar no Santuário de Nossa Senhora da Vitória, em Praga

Embora muitos tenham ouvido falar do Menino Jesus de Praga, poucos conhecem dados concretos a respeito dessa devoção à divina infância do Salvador do mundo1. Transcorrendo neste mês a comemoração do nascimento do Divino Redentor — a data máxima da Cristandade — julgamos oportuno apresentar a nossos leitores o admirável histórico dessa devoção ao Deus-menino.

Desde tempos imemoriais, os justos do Antigo Testamento ansiavam pela vinda do Prometido das Nações, que viria endireitar os caminhos tortuosos, aplainar os montes, encher os vales. Numa palavra, abrir o Céu para a humanidade pecadora. O Profeta por excelência desses futuros acontecimentos, Isaías, sete séculos antes da vinda do Divino Redentor, anunciou que Ele nasceria de uma Virgem.

Nos primeiros séculos da era cristã, muitos foram os santos que abordaram o tema do Deus Menino e seu nascimento, especialmente o Papa São Leão Magno2.

Coube à Idade Média a glória de corporificar e expandir essa devoção. Vários santos foram então chamados pela graça divina a manifestar especial enlevo pela divina infância de Nosso Senhor Jesus Cristo, ao qual se chega por meio de Nossa Senhora. São Francisco de Assis, ao meditar enternecido a respeito do grande Deus que se tornou frágil Menino numa manjedoura, montou o primeiro presépio para representar esse divino mistério. Santo Antônio de Pádua (ou de Lisboa), seguindo o exemplo de seu mestre e fundador, encantava-se com o Deus-Menino, e mereceu recebê-Lo várias vezes milagrosamente em seus braços. E é desse modo que o grande santo franciscano é comumente representado. Outros santos tiveram a mesma graça.

Entretanto, foi na Espanha da Contra-Reforma, durante o chamado “século de ouro”, que o divino Menino Jesus passou a ser venerado em imagens em que aparece de pé, manifestando um ou outro de seus atributos.

A grande Santa Teresa de Ávila introduziu essa devoção em seus conventos, e a partir deles espraiou-se por toda a Espanha e depois pelo mundo. Seu discípulo e co-fundador do ramo carmelita masculino reformado, o sublime São João da Cruz, entusiasmava-se tanto com esse mistério de um Deus feito homem, que, durante o período de Natal, levava a imagem do Menino Jesus em procissão, e bailava com ela ao colo. Compôs também tocantes poesias sobre a Natividade.

Assim, surgiram nos conventos carmelitas várias invocações do Menino Jesus, como El Peregrinito, El Lloroncito, El Fundador, El Tornerito e El Salvador.

Mas tal devoção não se limitava aos claustros. Já Fernão de Magalhães, quando descobriu as Filipinas, levava consigo uma dessas imagens de Jesus Menino, e lá a deixou, sendo ela venerada até hoje na ilha de Cebu.

Carmelita Venerável: confidente do Divino Infante

Coube porém a uma filha de Santa Teresa ser a confidente do Menino Jesus e a propagadora da sua devoção. Trata-se da Venerável Margarida do Santíssimo Sacramento (1619-1648), carmelita do convento de Beaune, na França. Esta freira, falecida aos 29 anos, entrou para o convento aos 11 anos como pensionista. Tinha grande familiaridade com os Anjos e Santos e o privilégio de participar de todos os grandes mistérios da Vida do Salvador, como seu Nascimento, Transfiguração e Paixão. Entretanto, recebeu a missão especial de venerar e propagar especialmente a devoção à divina infância de Cristo.

“Eu te escolhi para honrar e tornar visível em ti minha infância e minha inocência, quando eu jazia no presépio”, disse-lhe o Menino-Deus, quando ela rezava diante de uma imagem sua existente no convento, conhecida como O Rei da Glória. A Irmã Margarida do Santíssimo Sacramento recebia muitas graças extraordinárias, mediante as quais o Menino Jesus fazia-lhe compreender de um modo mais profundo esse mistério3.

Ela fundou a Família do Menino Jesus, convidando todos os que dela quisessem participar a celebrarem com fervor os dias 25 de cada mês, em lembrança da Santa Natividade, e a rezarem a Coroinha do Menino Jesus (três Padre-Nossos e 12 Ave-Marias) em honra dos 12 primeiros anos de sua vida.

Dois séculos mais tarde, outra carmelita, Santa Teresinha do Menino Jesus (+ 1897), honrou de modo especial o Deus-Menino, não só ao escolhê-Lo para seu nome em religião, mas iniciando a via da “Infância Espiritual”. Foi numa noite de Natal, a de 1886, que ela recebeu a maior graça de sua vida, segundo disse, isto é, a de sair da imaturidade da infância para entrar na grande via dos santos.

Ela se abandonava ao Deus-Menino com toda docilidade, como uma bola nas mãos de uma criança. Quando recebeu o encargo de adornar uma imagenzinha do Menino Jesus que havia no claustro, ela o fazia com grande devoção. Além disso, mantinha prolongados colóquios com o Deus-Menino diante da imagem do Menino Jesus de Praga que se encontrava no coro do noviciado.

Maravilha de Praga: o Pequeno Rei

Santuário de Nossa Senhora da Vitória, em Praga

Praga, capital da atual República Checa, é considerada, a justo título, uma das mais belas capitais da Europa. O visitante não se cansa de a percorrer, sempre descobrindo coisas novas e maravilhas não suspeitadas. Sua topografia concorre muito para sua beleza, e o rio Moldava, que a corta, tornou-se quase legendário. A arquitetura de Praga reflete os vários períodos de sua história. Nela se vêem desde fundações românicas, belíssimos exemplos do gótico religioso e civil, edifícios renascentistas, barrocos e clássicos. E até um exemplo da chamada “arte” moderna, como infeliz concessão ao espírito do tempo.

Entre os inúmeros prédios dignos de menção nessa cidade privilegiada, figura a igreja de Nossa Senhora das Vitórias, primeiro santuário barroco local, erigido de 1613 a 1644. Pertencente aos carmelitas descalços, nela está a grande maravilha de Praga: a encantadora imagem do Pequeno Rei, como é conhecido o Menino Jesus de Praga.

Raízes de uma devoção providencial

No século XVII, no primeiro período da sangrenta Guerra dos Trinta Anos, o Geral dos Carmelitas Descalços, Venerável Frei Domingos de Jesus Maria, havia se destacado, exortando os exércitos católicos na vitória do imperador alemão contra o príncipe eleitor do Palatinado, o calvinista Frederico. Em sinal de gratidão a ele, em 1624 o Imperador Fernando II chamou os carmelitas a Praga — então capital do Sacro Império Romano Alemão — e concedeu-lhes a igreja rebatizada com o nome de Santa Maria da Vitória, pela ajuda concedida pela Mãe de Deus ao exército católico naquela batalha.

No ano de 1628, Frei João Luís da Assunção, então Prior dos carmelitas descalços da cidade, comunicou a seus religiosos que havia sentido uma moção interior no sentido de que venerassem de um modo especial o Deus-Menino, para que Ele protegesse a comunidade, e a fim de que os noviços aprendessem com Ele a ser pequeninos para entrarem no reino dos Céus.

Quase simultaneamente a Providência inspirou a Princesa Polyxena de Lobkowicz — que então enviuvara e ia se retirar para seu castelo de Roudinice nad Labem — a doar ao convento carmelita uma imagem de cera do Menino Jesus, que possuía. Ele era representado de pé, portando trajes reais, com o Globo na mão esquerda e a direita em atitude de abençoar. Tal imagem era querida recordação de família, pois sua mãe, Da. Maria Manrique de Lara, a recebera como presente de núpcias quando se casou com Vratislav de Pernstein, e a dera à filha também como presente de bodas.

A Princesa Polyxena disse ao prior, ao entregar-lhe a imagem: “Eu vos ofereço, querido padre, o que mais quero no mundo. Honrai este Menino Jesus e assegurai-vos de que, enquanto O venerardes, nada vos faltará”.

Frei João Luís agradeceu o presente, que vinha tão milagrosamente ao encontro do seu desejo, e ordenou que a imagem fosse colocada no altar do oratório do noviciado. Ali os carmelitas se reuniriam todos os dias para louvar o Divino Infante e recomendar-Lhe suas necessidades.

Depois de um primeiro momento de prosperidade em Praga, os carmelitas ficaram reduzidos quase à miséria. O prior e seus súditos recorreram ao Menino Jesus, pedindo-Lhe que lhes fosse propício. Essa confiança não foi infundada. O Imperador Fernando II, Rei da Boêmia e da Hungria, conhecendo as necessidades pelas quais passava a comunidade carmelita, concedeu-lhe uma renda anual de mil florins e um auxílio sobre as rendas imperiais.

Ao mesmo tempo, sucedeu outro fato extraordinário que comprovava o quanto o Menino Jesus de Praga não deixava de socorrer aqueles que a Ele recorressem. Existia no convento uma vinha, a qual havia tempos estava completamente estéril. De repente, da forma mais imprevista, começou a florescer e a frutificar, sendo seus frutos mais doces e esplêndidos do que se podia imaginar.

Frei Cirilo: de miraculado a apóstolo do Menino Jesus

Dona Plyxena de Lobkowicz entregando a imagem do Menino Jesus aos Carmelitas de Praga

Habitava esse convento um jovem sacerdote, Frei Cirilo da Mãe de Deus, que, tendo deixado o ramo carmelita mitigado, abraçara a reforma de Santa Teresa. Porém, em vez de encontrar a paz que tanto esperava, sentia-se como um réprobo, sofrendo as penas do inferno. Nada o consolava ou apaziguava.

O prior, notando-o macambúzio e abatido, perguntou-lhe o que estava acontecendo. Frei Cirilo abriu-lhe o coração, contando todas as suas penas. “Uma vez que o Natal se aproxima, disse-lhe o prior, por que não se põe aos pés do Santo Menino e lhe confia todas as suas penas? Verá como Ele o ajudará”.

Obedecendo, Frei Cirilo dirigiu-se à imagem do Menino Jesus: “Querido Menino, olhai minhas lágrimas! Estou a vossos pés, tende piedade de mim!” No mesmo instante, sentiu como que um raio de luz penetrar em sua alma, fazendo desaparecer todas as angústias, dúvidas e sofrimentos.

Comovido e sumamente agradecido, Frei Cirilo tornou-se um verdadeiro apóstolo do Divino Infante.

Ataque sacrílego de protestantes

Entretanto, os protestantes se reagruparam em novembro de 1631, sob o comando do príncipe eleitor da Saxônia, e assediaram novamente Praga. Houve pânico entre os imperiais e a angústia dominou os habitantes da cidade. Muitos fugiram.

Frei João Maria, por prudência, mandou seus frades para Munique, permanecendo ele na cidade para custodiar o convento com apenas mais um religioso.

Praga capitulou. Os soldados protestantes invadiram igrejas e conventos, profanando e destruindo os objetos do culto católico. Puseram na prisão os dois frades carmelitas e começaram a depredar o convento. Vendo no oratório dos noviços a imagem do Menino Jesus, começaram a rir e a zombar dela. Um dos soldados, desejoso de mostrar-se diante dos outros, com a espada decepou as mãozinhas da imagem sob os aplausos dos companheiros. Depois, empurrou-a para o meio dos escombros a que ficara reduzido o altar.

Ali o Menino Jesus ficou esquecido.

Assinada a paz em 1634, os carmelitas puderam regressar a seu convento. Frei Cirilo não voltou com os outros, e ninguém mais se lembrou da imagem do Menino Jesus. Três anos mais tarde chegou Frei Cirilo e logo deu pela falta. Procurou a preciosa imagem, mas não a encontrou. Não havia o que fazer.

A paz, entretanto, não fora duradoura. Os suecos, rompendo os acordos, sitiaram outra vez Praga, queimando em seu caminho castelos e povoações.

O prior recomendou a seus frades que rezassem, pois só a oração podia salvá-los desta vez. Então Frei Cirilo sugeriu que se recomendassem ao Pequeno Rei, e pôs-se a procurar novamente a imagem. Depois de muito trabalho, encontrou-a finalmente atrás do altar, coberta de pó e sujeira. Por incrível que pareça, ninguém havia mexido naquele local durante aqueles atribulados tempos. Com alegria, levou-a ao prior. Diante da imagem com as mãos decepadas, os frades oraram fervorosamente pela salvação da cidade, o que realmente se deu. Os suecos levantaram o cerco.

Milagrosa restauração da imagem

Quando a imagem foi de novo entronizada no oratório dos noviços, os benfeitores do convento, que durante esses difíceis anos haviam também sumido, voltaram a trazer sua ajuda.

Certo dia Frei Cirilo estava em oração diante do Menino Deus, pedindo pela comunidade, quando Este lhe disse tristemente: “Tende piedade de mim, e eu terei piedade de vós. Restituí-me as mãos que me cortaram os hereges. Quanto mais me honrardes, mais vos favorecerei”.

Por motivos ignorados, o frade até então, não tinha se empenhado em restaurar a imagenzinha. Apressou-se a narrar ao prior o sucedido. Mas este parece não lhe ter dado muito crédito. E por causa da indigência em que se encontrava o convento, disse que era necessário esperar dias melhores, pois havia necessidades mais prementes.

Profundamente aflito, Frei Cirilo pediu a Deus que lhe desse os meios de restaurar a imagem, e a ajuda veio de maneira inesperada. Um nobre estrangeiro pediu àquele religioso para se confessar, e depois disse-lhe: “Reverendo Padre, estou convencido de que o bom Deus me conduziu a Praga para me preparar para a morte e fazer-vos um pouco de bem”. E entregou-lhe uma esmola de cem florins.

O frade procurou o prior, entregando-lhe a importância e pedindo pelo menos um florim para restaurar a imagem. Mas o prior, apesar desse pequeno milagre, disse que isso não era tão premente e podia esperar. Pior: mandou que Frei Cirilo tirasse a imagenzinha do oratório e a levasse para sua cela até que pudesse ser restaurada. Com lágrimas nos olhos, o frade obedeceu, pedindo ao Pequeno Rei perdão por sua incompreensão.

Apareceu-lhe então a Santíssima Virgem e o fez compreender que o Menino Jesus deveria ser restaurado o quanto antes, e ser exposto à veneração dos fiéis em uma capela a Ele dedicada. É sempre Nossa Senhora quem conduz a Jesus!

Uma circunstância propícia surgiu quando foi eleito novo prior, pouco tempo depois. Frei Cirilo fez-lhe o mesmo pedido, e este respondeu: “Se o Menino nos der antes sua bênção, então farei reparar a imagem”. Bateram à porta, e uma senhora desconhecida entregou a Frei Cirilo um bom donativo. O prior, entretanto, deu-lhe só meio florim para a restauração, dizendo-lhe que tinha que bastar. À insignificante importância somou-se logo generoso donativo de Daniel Wolf, funcionário da corte agraciado pelo Menino Jesus.

A imagenzinha foi assim restaurada e colocada dentro de uma urna de cristal próxima à sacristia. Cumpria-se assim o desejo expresso por Nossa Senhora a Frei Cirilo, de que o Menino fosse exposto à veneração pública.

Cura miraculosa e aumento do culto

Dona Plyxena, pequena, junto à sua mãe Dona Maria Manrique de Lara (Sanchez Coelho, séc. XVI

Um fato inesperado iria ter muita influência no culto ao Pequeno Rei. Certo dia, em 1639, Frei Cirilo, tido já por muitos como um santo, foi procurado pelo Conde de Kolowrat, Enrique Liebsteinski, cuja esposa estava gravemente doente. O Conde pediu ao carmelita que levasse a imagem do Menino Jesus à cabeceira da enferma, alegando que esta era prima da Princesa Polyxena, que havia doado a imagem ao Convento. Como vários médicos já a haviam desenganado, a única esperança que restava era o Santo Menino.

Frei Cirilo não podia deixar de atender tão justo pedido. Chegando ao quarto da moribunda, disse-lhe o marido: “Querida, abre os olhos. Vê, aqui está o Menino Jesus para curar-te”. Com muito esforço a enferma abriu os olhos, seu rosto iluminou-se, e ela exclamou: “Oh! O Menino está aqui no meu quarto!” E ergueu os braços para ele, a fim de osculá-lo. Vendo isso, o marido exclamou exultante: “Milagre! Milagre! Minha mulher está salva!”

A alegria foi geral. Apenas restabelecida, a condessa foi ao convento e ofereceu ao Menino uma coroa de ouro e objetos preciosos em sinal de gratidão. Este foi um dos milagres mais célebres atribuídos ao Pequeno Rei.

Tornado conhecido esse prodígio, é natural que sua fama começasse a disseminar-se não só na corte, mas também entre o povo da cidade e redondezas. E diante do altar do Menino Deus começaram a afluir, cada vez em maior número, peregrinos de todas as partes.

Isso fez com que uma rica dama da corte, levada por devoção indiscreta, furtasse a imagem. Mas esse sacrilégio foi castigado por Deus, e o Pequeno Rei retornou aos carmelitas.

As muitas doações em dinheiro e em espécie, com as quais os fiéis agradeciam graças recebidas do Divino Infante, tornaram possível construir a capela destinada à milagrosa imagem. Para sua solene consagração, em 1648, foi convidado o Arcebispo de Praga, Cardeal Ernesto Adalberto de Harrach, que concedeu aos frades a mais ampla faculdade de celebrar missa nessa ermida do Santo Menino Jesus. Com essa solene confirmação do Arcebispo, a capela do Pequeno Rei da Paz converteu-se num lugar de culto oficial e muito freqüentado.

Novas provações, altar definitivo

Novamente em 1648, em outra batalha durante a Guerra dos Trinta Anos, as tropas dos protestantes suecos invadiram a cidade e transformaram o convento carmelita em hospital de campo. Mas nenhum dos 160 soldados feridos ali tratados atreveu-se a escarnecer do Santo Menino. Pelo contrário, o próprio comandante dos invasores, o General Konigsmark, durante uma inspeção, prostrou-se diante da milagrosa imagem, dizendo: “Ó Menino Jesus! Não sou católico, mas também creio em tua infância e estou impressionado ao ver a fé das pessoas e os milagres que fazes em seu favor. Eu te prometo que, no que me for possível, farei levantar o aquartelamento do convento”. E entregou aos frades um donativo de 30 ducados.

Pouco depois os suecos levantaram o assédio de Praga, e todos atribuíram a libertação à proteção do Pequeno Rei.

Confirmação e expansão do culto

A imagenzinha do Menino Jesus sem os trajes com que habitualmente é adornada

Com a volta à normalidade, chegou a Praga em 1651 o Superior Geral dos Carmelitas, Frei Francisco do Santíssimo Sacramento, que aprovou a devoção do Divino Infante, recomendando aos frades que a difundissem pelos outros conventos austríacos e entre os fiéis. Deixou escrita uma carta, reconhecendo a legitimidade do culto à sagrada imagenzinha, que foi afixada na porta da capela do Menino Jesus.

Em 1655, graças à contribuição do Barão de Tallembert, a milagrosa imagem foi colocada em magnífico altar na igreja de Santa Maria da Vitória e solenemente coroada pelo Arcebispo de Praga, D. José de Corti. Ainda hoje se celebra uma festa solene no dia da Ascensão, em lembrança dessa coroação.

No ano de 1675, Frei Cirilo da Mãe de Deus entregou sua alma a Deus em odor de santidade, aos 85 anos de idade.

A devoção ao Divino Menino continuou alastrando-se por todas as camadas sociais. A grande imperatriz do Império Austro-Húngaro, Maria Teresa, quis confeccionar em 1743, com suas próprias mãos, uma rica veste para o Pequeno Rei.

Imagem preservada durante tiranias nazista e comunista

Em 1744, mais uma vez as tropas dos protestantes, agora prussianos, cercavam Praga. As autoridades da cidade acorreram ao convento dos carmelitas, pedindo ao prior que o Pequeno Rei fosse levado em procissão solene pela cidade, a fim de a livrar da destruição dos hereges.E realmente chegou-se a uma capitulação honrosa, sem batalhas; poucos meses depois os prussianos deixaram Praga, e todos seus comovidos habitantes acorreram à igreja de Nossa Senhora da Vitória para agradecer ao Menino Jesus mais essa graça.

Entretanto, outro perigo maior ameaçava a devoção ao Divino Infante. Em 1784, o ímpio Imperador José II suprimiu o convento dos carmelitas e confiou a igreja de Nossa Senhora da Vitória à Ordem de Malta. E assim, sem a assistência contínua dos carmelitas, o culto ao Menino Jesus decaiu.

Já no século XX, durante a II Guerra Mundial, houve a ocupação de Praga pelos nazistas, e depois o flagelo comunista abateu-se sobre o país durante quase 50 anos. Mas nem um nem outro inimigo da fé católica atentou contra a milagrosa imagem, que continuou em seu trono na igreja de Nossa Senhora da Vitória.

De Praga, o culto ao Menino Jesus já se havia estendido por toda a Europa, e daí para a América Latina (inclusive Brasil), Índia e Estados Unidos. Neste país, isso se deu graças à devoção de Santa Francisca Xavier Cabrini, que ordenou a entronização, em cada uma das casas do instituto por ela fundado, de uma imagem do Pequeno Rei.

Devoção expande-se a Arenzano

Coroa do Menino Jesus de Praga

Em 1895, os carmelitas de Milão pediram ao Cardeal Ferrari licença para introduzir a devoção ao Menino Jesus de Praga em sua igreja de Corpus Domini. O Cardeal não só autorizou a entronização, mas quis ele mesmo fazê-la em presença de três mil fiéis. Na ocasião, consagrou todas as crianças de Milão ao Menino Jesus de Praga.

A partir de então, essa devoção conquistou o coração dos italianos.

No convento carmelita de Arenzano, fundado em 1889 pelo irmão do fundador de Corpus Domini, surgiu a idéia de se expor um quadro representando o Menino Jesus de Praga na igreja do convento. Os habitantes da cidade logo se mostraram muito sensíveis ao novo culto, e o Pequeno Rei atendeu suas orações e pedidos com muitas graças e bênçãos.

No ano de 1902, para substituir o quadro, a Marquesa Delfina Gavotti, de Savona, presenteou os frades com uma imagenzinha do Menino, cópia exata da de Praga. A enorme afluência dos fiéis ante o altar do Menino Jesus convenceu os frades a construírem um santuário expressamente dedicado a Ele. A primeira pedra foi colocada em outubro de 1904, e quatro anos mais tarde o templo era solenemente consagrado.

O cronista do convento carmelita anotou então: “Para todos foi claro que só o culto à infância divina, venerada com o título do Santo Menino Jesus de Praga, deu origem, desenvolvimento e feliz final à nossa empresa de construir esta igreja, para que fosse para os fiéis de toda Itália o centro propulsor desta devoção”.

No dia 7 de setembro de 1924, Sua Santidade o Papa Pio XI enviou especialmente o Cardeal Merry del Val para coroar solenemente a sagrada imagem. Assim, a devoção ao Menino Jesus de Praga recebia a aprovação oficial da Igreja.

Em Praga: proibição do culto pelos comunistas

Enquanto em Arenzano florescia a devoção, em Praga, transformada em capital da então Checoslováquia, o regime comunista impedia o livre exercício de culto, propugnando o ateísmo do Estado. Em 1968, uma tentativa de livrar-se do regime ímpio foi sufocada com sangue na chamada Primavera de Praga.

A devoção ao Menino Jesus continuava restrita aos que freqüentavam a igreja onde estava exposto, e também ao fruto do apostolado das monjas carmelitas que, deportadas para longe de Praga, pintavam estampas com o Santo Menino e as enviavam clandestinamente a outros conventos europeus.

Finalmente, em 1989, com a queda do Muro de Berlim, e depois, com a Revolução do Veludo, cessou a ditadura comunista na Checoslováquia, que se transformou na República Checa, independente e soberana. Foi restabelecida a liberdade civil e religiosa, e o novo Arcebispo de Praga, que fora também vítima da repressão comunista, quis que reflorescesse a devoção ao Menino Jesus. A convite dele, dois frades carmelitas, justamente de Arenzano, foram para Praga reabrir o convento e estimular a devoção ao Divino Menino Jesus.

Notas:

1.Este artigo foi baseado na excelente obra El Pequeño Rey, de Sorella Giovanna della Croce, C.S.C, tradução do italiano para o castelhano pelo Pe. Juan Montero Aparício, AGAM, Madonna dell’Olmo, Cuneo, Italia.

2.Vide, por exemplo, suas Homilías sobre el año litúrgico, BAC, Madrid, 1969, pp. 99 ss.

3.Cfr. Les Petits Bollandistes, Vies des Saints, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, Paris, 1882, tomo 15, p. 379.

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1 COMENTÁRIO

  1. Existe alguma tradução para o português de “El Pequeño Rey”? Sem mais, excelente artigo, muito bem escrito e muito edificante!
    Salve Maria!

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