Vencidos os tempos caóticos típicos do início da Idade Média, os nobres que viviam nos castelos-fortalezas foram reformando seus castelos e lhes dando o ar elegante e maravilhoso que hoje contemplamos.
A nobreza continuou assim vivendo no meio do campo numa residência muito boa.
Os castelos na Idade Média, de início rústicos, maciços e austeros por causa de sua finalidade militar, foram sendo ajeitados.
E das inacessíveis fortalezas feudais se passou às residências magníficas que deslumbram os séculos.
Nelas viviam os nobres do campo.
Eles não os derrubaram, mas fizeram algo mais interessante e inteligente: procuraram conservar, tanto quanto possível, o tom medieval original.
E fizeram disso um ponto de honra: afinal de contas foi naquelas torres e muralhas que seus antepassados viveram e morreram para salvar a civilização e a região onde estão instalados.
É a dimensão histórica que faz dos castelos medievais algo como que insuperável, mesmo pelas tentativas de imitação como a Disneylândia.
Quando os povos foram se cristianizando, os costumes ficaram menos violentos e a paz foi se instalando por toda Europa.
Os castelos deixaram de ter a finalidade quase exclusivamente militar originária.
Então, os nobres do campo apelaram ao melhor da arquitetura e das artes para embelezar as fortalezas.
Como no tempo dessas melhoras predominava a arte renascentista, censurável debaixo de alguns aspectos e admirável debaixo de outros, os nobres do campo fizeram uma seleção dos novos estilos.
E criaram uma coisa única: as mais maravilhosas residências dos Tempos Modernos, que reuniam a história e o progresso das artes.
Os castelos de Chenonceaux e de Chambord, para só citar esses, são um exemplo muito concreto.
E as fortalezas militares viraram verdadeiros palácios, e que ainda se chamam de castelos.
O luxo interior, antes inexistente, passou a ser grande, os parques, outrora sacrificados por razoes militares, ficaram magníficos, os terrenos que a nobreza reserva para si passaram a ser plantados como por um pintor formando conjuntos arborizados de sonho.
Nesses parques, instalaram lindos jogos de artifício de água, com espelhos aquáticos e jorros fantasiosos que entretêm a vida do campo, que sem eles facilmente se torna monótona.
A nobreza melhorou os caminhos e ficou muito fácil a viagem de visita de uns castelos para outros, de uns palácios para outros.
De maneira que a todo o momento os nobres se reuniam no castelo ou no palácio de um ou de outro para festas de família, casamentos, batizados, reuniões, ou para tratar de interesses comuns da agricultura, ou inclusive interesses políticos gerais.
Muito frequentemente esses castelos de origem medieval eram bem conservados, e ficavam muito bonitos, com tapeçarias, vitrais, móveis finamente trabalhados com as melhores madeiras, porcelanas, pratarias que o comércio trazia para a Europa de continente longínquos, como a Ásia ou a América do Sul, portuguesa ou espanhola.
Também conservavam recordações dos grandes feitos de guerra dos antepassados: armaduras medievais, salas exclusivamente destinadas a servir de uma espécie de museu de armas medievais.
Então aquelas armaduras que cobriam inclusive o rosto, postas de pé apoiadas sobre uma espada, por vezes de meter medo, com aquela presença dava a impressão de que de dentro uma recordação prestigiosa dizia: “Lembre-se que eu fui um herói”.
Era frequente também que, nas peças de mobiliário do castelo, figurasse com destaque o escudo da família.
O escudo é como um resumo simbólico do passado e da ascendência da família.
Conhecido como “as armas”, o escudo, ou brasão, incluía aquilo que o duque de Saint-Simon, grande escritor sobre essa matéria, chama de la chimère, quer dizer as origens por vezes quiméricas da família.
Pois muitas daquelas grandes famílias pretendiam descender, de um modo ou do outro, de reis, de príncipes, de figuras famosas, de cruzados, de heróis de guerra, mas a relação ou as provas se tinham perdido através dos séculos.
Esses brasões provinham de costumes imemoriais e davam uma nota de esplendor e de fantasia oriental à atmosfera que cercava a nobreza. E dignificavam a família em um grau extraordinário.
O nobre de fazenda, para usarmos uma expressão caracteristicamente brasileira, representava a força, a coragem, a capacidade de lutar, a capacidade de organização da vida agrícola, virtudes reconhecidas por todos.
As senhoras deles naturalmente eram menos rudes, mas montavam a cavalo também e eram a versão feminina de seus maridos.
Isso punha-as muito em contato com os pobres do feudo, e não era raro que muitas delas ajudassem economicamente os pobres.
Para isso mantinham enfermarias nos salões inferiores do castelo.
Também tinham salas onde a senhora do lugar uma vez por semana, às vezes no próprio domingo, recebia os aldeões mais necessitados ou preocupados.
E até tinham uma espécie de consultório médico com os remédios primitivos da época e distribuíam segundo os casos.
Elas entendiam muito de remédios, e ainda não tinham aparecido os médicos especializados com muito mais competência de nossos dias.
Então, elas aprendiam mais ou menos a arte de curar, davam receitas e remédios caseiros, naturalmente grátis, socorriam os pobres, os acidentados, e encaminhavam para o hospital da cidade – em geral religioso – algum necessitado para cuja situação não havia remédio no feudo.
(Autor: Plinio Corrêa de Oliveira, palestra em 8/4/94, sem revisão do autor)